sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Pay it forward




Porque me ocorreu ontem.
Conheci o Padre António Amaro em meados de 2001. Em trabalho (curioso para onde me tem levado o trabalho) para os Jogos Santa Casa, comemorava-se na altura os 500 anos da Lotaria Nacional, instituída por D. Maria I, "Raínha santa", como é por ali conhecida.
Este homem foi um dos criadores e grande mentor de um projecto de impressionante humanidade, solidariedade e respeito pelo ser humano, a Aldeia de Santa Isabel. Esta instituição alberga no seu espaço mais de 200 pessoas, entre recém-nascidos, crianças e jovens, e idosos. Vivem todos de acordo com um princípio básico por ele promovido, "eu ajudo-me, ajudando-te". É o Pay it Forward à portuguesa, portanto. Numa das muitas noites por lá passadas, e quando chegava o silêncio da noite que tanto amedronta as mais de 50 crianças lá residentes, sentámo-nos na cozinha a beber o seu café trazido de Monção. Forte, como ele. Naquelas noites, contava-me as mais incríveis histórias de sobrevivência, de força interior, de crença e fé. Naquela noite chuvosa de Dezembro, contou-me a história dele. Posso partilhá-la, ele próprio a tornava pública. Foi recém-nascido abandonado, criança adoptada e violentada consecutivamente durante 3 anos, jovem institucionalizado. O pior possível. Até que numa situação particular vivida aos 16 anos, cheio de angústias, medos, raivas incontidas e uma solidão aterradora, ajudara alguém pela primeira vez na vida. A partir daí, dizia, criou-se uma razão interior que o levou a escolher a congregação onde dificilmente entrara. E passou mais de 30 anos nessa missão. Ajudar. Ele que se considerava um ser cheio de imperfeições. Do que lembro dele, e cada vez que me vem à memória cada acto da sua vida na Aldeia de Santa Isabel, só me ocorre o bom que é ter conhecido uma pessoa que, identificando-se como imperfeito, era e é um dos seres mais perfeitos que conheci.