quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Jácke - o Super Herói (...ou como a decepção pode ser patética)



Jácke observa as estrelas, por entre os seus óculos especiais. “Cassiopeia, Cassiopeia, por onde andas minha bebé?”. Está nisto há horas na sua cadeira de praia sentado na varanda virada para o Mundo, quando é despertado pelo impulso das suas próprias palavras, milhares delas dirigidas a Pandora. Parêntesis: Jácke é assim, sabe que escreve para ele próprio, sabe agora que só a ele lhe provocam impulso. Fecha parêntesis. Ia no impulso. Abre o frigorífico e puxa da sua Kriptonite. Marmelada. Junta-lhe bolacha Maria do Recheio (a mais barata). E prepara o seu plano. Planeia, este gajo.
Manhã cedo e pensa “é hoje”. Veste o seu fato de super-herói comprado noutros tempos provavelmente na loja mais barata (é uma fixação). Esforço brutal. No fato vivem ainda bocados de sal de fato mal lavado e o tempo do armário da arrecadação que lhe trouxe novidades. Perna esquerda, perna direita. Encaixa bem o livrete, carta de condução e seguro e está pronto. Olha-se ao espelho, um egocêntrico o gajo, e exclama “Olha que foda-se...está-me grande”. Tudo lhe fica grande hoje. É que já foi muiiiito grande este super-herói. Mesmo assim, gosta do que vê. Sente-se forte, aventureiro, imbatível mesmo. Ala para a rua. Chegado à rua, lembra-se doutra coisa. O seu Super-carro está “ausente” em parte incerta. Não faz mal, leva o segundo. É rico, o gajo. Cinto posto, gps ligado e siga para a Pandora. A viagem corre bem. Quer dizer, mais ou menos. Ou o tempo está mau, ou o fumo dentro dos óculos é demasiado. Não chega a perceber, não perde tempo com minudências. É grande e profundo, o Jácke. Chegado ao local, estaciona o seu super-carro-substituto. Está a retirar as suas armas da mala do carro quando é atacado pelos primeiros adversários. Duas águias voam ferozmente contra ele (a Vitória, e a outra...a que nunca encontra o símbolo, cega portanto). Mas vêem destemidas. Mas está preparado, e saca da sua pistola de água roubada em casa dos sobrinhos e mata-as. Não com a água. Com a dita mesmo. Pimba, pimba, pimba. E segue, triunfal.
Ao chegar à porta, Jácke é reconhecido. “Olha que foda-se”, pensa de novo. Dois Iphones gigantes barram-lhe a entrada e querem impedi-lo de passar. Luta mais difícil esta. Disparam-lhe mensagens e mensagens, fotos e fotos, palavras e palavras. Desta vez, conseguem feri-lo. “Então eram aqui que estavam as minhas mensagens, seus cabrões!”. Enfurecido, puxa de um pau. Um pau, pau, mesmo. E dá-lhes com alma. Lembra-se de Eça de Queiroz (um erudito além do mais o super-herói), que, dizia que quando a palavra falta, sobra a paulada. Pimba, pimba, pimba nos Iphones. Vence-os, claro. Entra la loja onde Pandora está, já vai ferido. Mas destemido, sempre. Agarra no microfone e grita “Pandora, Pandora, Pandora!”. O local está cheio, milhares de pessoas. Pára tudo. Silêncio sepulcral no local. Todos o olham. Mas com admiração. Aqueles óculos são irresistíveis. Cosnegue juntar a multidão a si e desta vez gritam todos: “Lalalalalala....lalalalalala...só nós queremos a Pandora aqui!”. Jácke deslumbra-se e distrai-se. Entusiasma-se facilmente o gajo. Nesta distracção aparece-lhe outro adversário. Vindo nem sabe de onde, como e porquê, aparece-lhe pendurado numa corda. E confronta-o. A multidão está hesitante e expectante. Antes de o confrontar, Jácke abre a sua lancheira sport-billy e saca de mais um pouco de marmelada. E flores. Distribui flores pelas milhares de pessoas. De todas as cores e feitios, mais vulgares e mais raras. Um cavalheiro, o Jácke. A multidão grita “Jácke, Jácke, Jácke”. O seu adversário, o tal vindo não sabia ele de onde, como e porquê, e entra em acção. Confronta-o com palavras e palavras, frases e frases, às centenas. Deixa-o confuso. Hesitante. Não consegue perceber uma única frase completa. Um Adónis das palavras, conhecido ali nas redondezas pelo Maneli. E pede-lhe um pequeno time-out. E faz o óbvio nestes momentos. Vai fumar. Regressa e diz-lhe.


O outro, perante tal movimento, foge. Ou esconde-se. “Este cabrão há-de regressar, pensa Jácke.”. A multidão felicita-o, abraça-o, leva-o em ombros. Está eem grande o super-herói. É, digamos, o seu Momento, vá.
A multidão clama por Pandora. Chamam-na em gritos estridentes, e Jácke aguarda. Triunfante, forte, destemido, respeitoso.
Pandora aparece, caminha lentamente na sua direcção. Silêncio absoluto na loja. A expectativa é grande. Ao fundo, ouve-se....



Pandora corre para Jácke, vai abraçá-lo.
Jácke retira os óculos, o fumo saído lá de dentro activa os alarmes de incêndio e chove na loja. O momento é, agora de grande adrenalina e sensualidade. Os cabelos negros e ondulados de Pandora esvoaçam (alguém, entretanto, e para ajudar a história, ligou um ventilador gigante, pronto). Olham-se e Jácke diz-lhe: “Pandora, só queria abrir a tua caixa. Não me deste tempo.” E vai embora.
Olha que foda-se.