terça-feira, 30 de agosto de 2011

Um beijo à Dona Joana.

A Dona Joana é de Elvas. Já com 50 anos bem completos, desde os 45 que vem a Lisboa todas as semanas. Terças e quintas. Não falta. Nos dois últimos meses, contudo, o ritual alterou-se um pouco. Já não vem na companhia do João e da Anabela, bombeiros voluntários da terra, ele filho do Sr. Manuel da mercearia, e ela, jovem estudante, filha única dos pais mais "abonados" da vila. Um dia vão casar, diz Dona Joana.
Pois bem, conta ela que agora (desde junho), vem com o filho, o Manuel. Muito porreiro o Manuel, mecânico de profissão, já tentou a sorte na apanha dos morangos em Espanha, mas desde que a mãe tem precisado, resolveu voltar à terra. A Dona Joana e o Manuel vêem então a Lisboa todas as terças e quintas. Apanham a rodoviária no largo da estação às 5 da manhã e, após uma viagem longa com paragem na estação de Grândola, cá chegam. Todas as terças e quintas regressam, por volta das 20.30h,é o horário possível. Chegam a Elvas por volta das 23.30h. Ela a tempo de dar um beijinho no sr. Tiago (seu companheiro há 26 anos). O Manuel a tempo de descansar que no dia seguinte é tempo de trabalho a dobrar para compensar o dia em falta.
A Dona Joana já fez nestes 5 anos, um auto-transplante de leucemia, retirou um dos peitos, e trata agora novamente a leucemia que teima em não a largar. Como disse atrás, vem para Lisboa duas vezes por semana, fazendo 1600 quilómetros na rodoviária. A doença que tem não está dentro dos parâmetros exigíveis nos novos tempos, não sendo por isso possível ser transportada pelo João e pela Anabela. Definidos por homens e mulheres que se transportam em carros topo de gama, conduzidos por um dos mais de 10 motoristas por ministério. É a liberal social-democracia, dizem eles. Vão à merda.

domingo, 28 de agosto de 2011

Não há amor maior


Voltando ao homem. Reconheço-lhe várias virtudes. A primeira é ser um romântico, sendo Alemão.
E depois, outras, bem mais interessantes. Era um elogiador. Gosto de quem tem humildade, sabedoria e visão para saber elogiar. É um acto de respeito, e de coragem.
Coragem, porque só o corajoso admite o grande amor. Porque corre o risco de não ser correspondido (no caso dele, julgo que todos). É um acto de expúria interior provocado por uma explosão emocional incontida. Corajoso porque está sempre em contra-mão. Não esconde, não tem vergonha de dizer, de admitir. Coragem, portanto.
Elogio à mulher. Coloca a mulher no seu ponto de inspiração. Inspiração para a tranquilidade. Sendo, ao mesmo tempo, uma fonte de desejo, de paixão enfurecida, de sabores que ficam na memória dos lábios, de cheiros que entram como cocaína pelas veias ardentes. De peles suaves em corpos selvagens. Inspiração, portanto.
Tranquilidade interior. Em Goethe, o romântico é um pragmático. Não se alimenta de amores platónicos. Deseja, provoca, tenta encantar. Quando alcança, bebe até à última gota e partilha o vivido.
Cumplicidade. O romântico é mais cúmplice na afectividade. Vive a alegria do outro, como se da dele se tratasse. Dá-lhe espaço para brilhar, prepara-lhe os holofotes e alimenta-se extasiado da luz que não é dele. Inspira-se nos gestos simples, nos actos escondidos do dia-a-dia, nas palavras únicas. Sente-se bem, na medida em que o outro está bem.
Contempla. Ele prefere o desejo, o beijo, o abraço, o toque dos lábios húmidos e o sabor do corpo deitado na cama, após um banho relaxante. Mas, ainda assim, gosta de contemplar. Descansa com o descanso do outro. Ainda que aguardando o momento em que os olhos se abram, acorda de noite, abre a portada da janela por onde entra uma luz ténue e o olhar voyeur dos vizinhos, e contempla a silhueta. Olhares desatentos ou almas tristes dirão que isto é obsessão. Não é. É admiração. Não há amor maior. Em Goethe, claro...

e porque hoje é dia de Goethe...


"O mais singular livro dos livros
É o Livro do Amor;
Li-o com toda a atenção:
Poucas folhas de alegrias,
De dores cadernos inteiros.
Apartamento faz uma secção.
Reencontro! um breve capítulo,
Fragmentário. Volumes de mágoas
Alongados de comentários,
Infinitos, sem medida.
Ó Nisami! — mas no fim
Achaste o justo caminho;
O insolúvel, quem o resolve?
Os amantes que tornam a encontrar-se."
Livro do Amor

sábado, 27 de agosto de 2011

"Poder relacional"

A propósito do grande destaque de hoje do Expresso e de uma conversa tida ontem de manhã, surge-me o tema da relação. Aquilo (no Expresso) resume-se a uma expressão que me foi dirigida. Foi-me dito, entre cavalheiros claro, que Portugal é um país onde as decisões são tomadas através daquilo a que ele chamava de "poder relacional". Parece-me be, pensei, relações é comigo mesmo. E expliquei.
Falava-se de trabalho, claro. E ainda bem, são as únicas (as relações), onde ainda consigo dizer algo. Ainda. E falando de trabalho, lá vim com o discurso usado, derivado da idade certamente, mas usado, pronto. Que ando cá (neste trabalho), há mais de 20 anos. Que já fiz de tudo, que já trabalhei com todo o tipo de gente. Que já aprendi com muita gente, que já encontrei demasiada gente preguiçosa, injusta, indiferente, premeditada e desrespeitadora. Explicada, portanto, que não era a primeira reunião onde os encontrava. Primeira mensagem passada, tentei explicar aquilo que entendo eu também por "poder relacional".
Ele existe de facto. Em mim e nos meus actos também. Procuro a relação com o bom, com o honesto, o trabalhador, o inovador, o criativo, o justo, o solidário, o empenhado, o inteligente, o desruptor. E tenho encontrado. E sim, ao longo dos anos, muito "poder relacional" tem sido criado, alimentado, cultivado, tentando eu na minha singela importância, retribuir exactamente na medida em que recebo. Fossemos todos assim, e procurássemos este "poder relacional" e Portugal seria um país bem melhor. Mais justo socialmente, mais aberto culturalmente, mais próspero economicamente, mais forte na sua identidade, mais assertivo, mais apaixonado. Seria mais exemplo, cada um de nós. Acredito que ainda é. Venha esse "poder relacional" humano, respeitador e assente no valor individual do ser humano em prol da sociedade. Tenho a certeza que, sendo assim, será um país onde um grupo de homens vestidos nos seus aventais, nada decidirá. Ainda que cheio de boas intenções, que os seus bons nomes carregam.

gesto simples

Um abraço. Gesto que pode ser tão simples ou tão complexo. Tão inócuo ou tão sentido. Tão solto ou tão intenso. Gesto que pode abarcar num breve minuto a tranquilidade de uma vida inteira. Tão simples. E tão importante.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

não.

Diferença = Esperança


Adele - Someone Like You (BRIT Awards 2011) por javierlobe

Talvez herança de pais que, a meio de uma vida, perderam tudo, arregaçaram mangas e fizeram-se à luta, cresci na esperança. E na diferença. Na tentativa de percepção da diferença, do olhar diferente, a palavra diferente, o gesto diferente. Sempre me trouxe mais esperança, a diferença. Já adolescente, insisti na marcha contrária, ergui bem alto voz e gestos na insistência da diferença. Fruto de leituras pouco adequadas à jovialidade de pensamento, e da procura da diferença, lá me fui enchendo de esperança. Entram, enfim, as escolhas mais difíceis. Trabalho, namoros, amigos, companhias. Novamente no trabalho, lá veio a procura da diferença. O diferente é, por natureza, um ser de coragem. Para assumir convicções, afirmar certezas, escolher o não óbvio. Baseia-se numa vida de aprendizagem, de pensamento interior, de uma alma forte, sonhadora, arrojada. Por isso traz mais esperança. Ao mesmo tempo, os amores. Já tarde, bem tarde, descoberta de nova diferença. A contemplação do belo. A abstracção pura da realidade, que transporta para um estado de tranquilidade inimaginável até esse momento. É um caminho, certamente. Este da procura da diferença. Faz errar, cegar temporariamente, enganar na avaliação. E perder, faz perder de forma a deixar-nos num estado de tristeza indescritível, desolador. Mas faz mais, muito mais que isto. Esta procura permite encontrar. Permite os melhores momentos recordados para uma vida inteira. Permite, em primeiro lugar, fazer o sonhado. Sim, o que é sonhado também se faz. Permite o encontro. É sempre melhor encontrar uma vez na vida, que passar uma vida na procura do encontro. Acontece a poucos, é o gozo de apenas alguns. Permite uma realização interior que nos transporta a um ponto que sabemos ser o mais alto. Permite o melhor de tudo (para mim que sou um homem de memórias), a eternização do sabor. Tenho vários sabores que não esqueço jamais. A cumplicidade da juventude, a imensa realização profissional, os milhares de beijos e abraços recebidos no tempo em que fui mais importante na vida. E os principais. Os abraços de um pai e de um irmão que foram, são e serão sempre sentidos como os melhores. As primeiras vezes em que ouvi "tio". A primeira vez que beijei a única mulher que me trouxe amor. E o beijo que te dei hoje, minha mãe. Someone like you, de facto, não existe. Uma força inesgotável, um sorriso que não termina nunca, e uma esperança que nos abala.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Perfeição nos detalhes

A capacidade de ser perfeito nos detalhes, sempre foi algo que me fascinou. Por motivos óbvios, dada a característica dominante aqui na pessoa, para a mais cuidada e estudada imperfeição nos detalhes.

O simples cuidado de fazer bem, enquadrado, alinhado, com sentido. Já dizia Churchill que a perfeição do batalhão, via-se no botão do soldado. Este cuidado na continuidade dos actos, na tranquilidade da soma dos elementos, na leveza de um olhar para o conjunto, englobando sempre os vários individuais. Falo do trabalho, claro. Mas o que percebo hoje, é que só trabalha desta forma, quem é desta forma. Este olhar diferente vem da alma. Este sentir diferente vem do coração. Este fazer diferente vem de um estado interior que pulsa constantemente em busca de realização. De tranquilidade. De estar bem. Conheci duas pessoas assim. Iguais. Um privilégio, o meu.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Gente boa

A propósito de gente boa hoje, claro, lembrei-me de uma mulher.

Com nome de rabina e corpo de mulher, ela era nas suas próprias palavras "uma salteadora do amor". Era a figura feminina de Richard Gere em "American Gigolo" (sem a parte do gigolo...). Uma arrasadora. Bonita, forte, inteligente, assertiva. Tudo o que um homem mais procura, mas mais teme.

Era multi-funções. A última faceta que lhe conhecia era a de formadora num curso de pós-graduação em comunicação assertiva, para um grupo deste jovens turcos que nos inundam os tempos desde há alguns anos. Imagino-a ali. Calça de ganga justa, botas altas, camisa branca desabotoada no peito contornado. A dar formação. Conheci-a h+a muitos anos, estávamos os dois a iniciar i curso na faculdade, ainda longe de que aquele (hélas) faria parte da uma vida. Eu, chegado numa terceira fase de candidaturas (a fase da piedade, vá), ela vinda de duas semanas do curso de Antropologia, do qual pedira transferência. Claro. Dois estranhos caídos num grupo já constituído, com as cumplicidades já formadas e os mecanismos informais de amizade estabelecidas. E, aos poucos, lá me fui enturmando. Ela não. Demorou, demorou muito. O tempo fez-nos andar por caminhos diferentes, que se foram cruzando de quando em vez. O profissional arranjava um espaço para o pessoal. Fomos assim daqueles amigos que, nas suas imensas diferenças, se respeitaram sempre. Na verdade, tinhamos cada um de nós, parte do que o outro gostaria de ser. Vem isto a propósito de gente boa. E da desilusão. Ela costumava dizer que o que mais lhe tirava o sono (e era pouca coisa), era saber que provocava desilução em alguém "bom". Era assim, tinha os bons e os maus bem estratificados. E vem a propósito de outra coisa lembrada hoje. Que ela era mais uma destas pessoas boas nas intenções e nas vontades, mas péssimas na prática das mesmas. Mais uma.

sábado, 13 de agosto de 2011

não há melhor forma

"O porquê de seguir o meu coração? Porque ele não me engana nunca. Como pode? Se eu gosto, se eu lembro, se eu recordo, se eu não esqueço. Se eu rebentei todas as minhas entranhas em cada beijo, cada abraço, cada palavra, cada gesto. Se eu ceguei em cada hora mais cedo da manhã, ou dancei minha alma nas horas mais tardias. Me diga você? Sabe melhor forma de saber?"

José de Alencar

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

ontem

Tempo. Tudo modifica, tudo altera. Faz-nos miúdos e homens. Namorados, casados, separados, divorciados. Faz-nos perseguir desejos, concretizar vontades. Emocionar, rejubilar, sonhar, abraçar. Chorar, perder, desistir, afastar. Todos nos encontramos nestes caminhos que parecem realizados por Fassbinder. Mas faz-nos andar. Seguir, ainda que na tristeza. Alcançar, ainda que pensado para nada. Faz-nos acordar de manhã, encarar a verdade do hoje, a maioria das vezes fingindo existir a verdade do ontem. Acreditar que o Ontem era o futuro. Acreditar que o pior do presente não existe. Um engano provocado pela emoção dos tempos. Uma coisa não-real de tão má que é. Será apagado no tempo. É a única forma.

p.s. (e para comprovar a teoria, é preparar para a Complexa Escolha da Lingerie - Parte III...a pedido de várias famílias)

domingo, 7 de agosto de 2011

o melhor aniversário


Wonderful tonight Eric Clapton por lsfilipe

Já aviado com o quinto Jack Daniels com uma pedra de gelo, como sempre gostou, Francisco lembra-se daquele dia. Com Madalena viveu os dias mais felizes da viva, isso soube na altura, e sabe hoje. Já lhe falta o discernimento para a lembrança completa, mas lembra-se do melhor.
Era o dia do seu aniversário, mas, ao mesmo tempo, um dia muito importante na vida de Madalena. Estreava a sua primeira peça de teratro, o D. Maria estva esgotado há muito. Madalena era assim, uma mulher que encantava o Mundo, e assim que se soube que ela finalmente estrearia a sua primeira peça, rapidamente esgotou. Bem, é verdade que Francisco ajudou, não se cansou enquanto não chateou os seus milhares de amigos para irem, e recomendarem a outros que fossem. Adiante.
Fascinado com a noite que o esperava ao lado da mulher da sua vida, apenas os telefonemas dos amigos e da família o fizeram lembrar que aquele era o dia dos seu aniversário. Madalena lembrara. Em casa, na preparação para o teatro, Madalena esperimentara mil e uma peças de roupa, guardadas desde que se lembrava. Era assim ela. Cada peça de roupa, cada assessório, cada sapato tinha uma história, um momento e ela sabia-os todos de cor. E era deliciosa a forma como os contava. Tal como era delicioso observá-la a preparar-se. Prática, rápida, com poucas preocupações estéticas. Não precisava. E ficava sempre fabulosa. “A simples forma de ser magnífica”, dizia Goethe. E dizia ele, agora. Perguntavalhe sempre no mesmo tom, na mesma forma, com os mesmos gestos. “Estou bem?”. Estava sempre. Lembra-se, claro, que também naquela noite, a sua vontade era a de a despir o mais rápido possível, beijá-la e fazer amor a noite toda. E, no fim, agarrar-lhe na cabeça e dizer-lhe “amo-te”. Só pensou, não fez. Estúpido. E então lá foram. Correu como ele esperara. Todos paravam para falar ou cumprimentar Madalena. Via-se nos olhos e nas palavras de todos, a admiração que lhe tinham. E brilhava, brilhava sempre Madalena. E ele, claro, peito cheio, cigarro atrás de cigarro, e vinho atrás de vinho, cheio de cagança. “Sou o maior.” Peça estreada, elogios da praxe feitos e Madalena apressa-se. “Bom, vamos embora?”. Francisco estranhou, mas ir embora porquê, aquela era a noite dela, porque raios se quereria ir embora? “Vamos Francisco, é o teu aniversário, temos que ir jantar.”. E foram. Fizeram-se a caminho, e Madalena conduz. Era o seu carro, ali quem mandava era ela. Converseta pelo caminho sobre a noite de estreia, Francisco no seu exaustivo discurso sobre como ela brilhara, que era magnífica, linda. Para ela, os adjectivos saiam-lhe a uma velocidade estonteante. Nem dera pelo caminho que Madalena fizera. O restaurante havia sido escolhido por ela, sem ele saber, e ficava junto à praia. Num hotel bonito, parecera de propósito, a sala estava só para eles. No jantar, o habitual, o tempo e as palavras passavam com a tranquilidade dos Deuses. E a cerveja também. Madalena levanta-se a meio, para ir à casa de banho. Ele, fascinado, continuou entusiasmado no jantar e na cerveja que o acompanhava. E noutro pensamento, óbvio. “Onde irei com ela a seguir?”. Ela regreessa è mesa e traz consigo a chave de um quarto (ou cartão, que agora é tudo cartonado). “Hoje ficamos aqui...”, diz-lhe, naquele olhar terno e sensual, como quem dedica a noite ao outro. Sentiu vontade de gritar (gritou mesmo), e agradeceu-lhe. Madalena deixou-o sem palavras. Terá sido a melhor oferta de aniversário que algum dia tivera. Nunca lho disse, lembra-se agora. Mais um Jack Daniels...

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Vinho tinto



“Então vem”, dizia na sms. Elevado por uma mola forte, sai a correr e deixa um escritório desarrumado. Ainda mais. Pára, por segundos e conclui que aquela sms não era para ele. Não podia ser. “Que se lixe, se for para mim, bem bom. Se não for, vou na mesma, afinal de contas não se barra à porta quem traz convite. E o meu já cá canta.”, concluiu em menos de 5 segundos.
É já noite e a luz do prédio fraquinha esconde as escadas traiçoeiras. Alia-se a traição das ditas, à sofreguidão de Francisco e, claro, espalhanço. Camisa ajeitada, óculos recuperados e aí vai ele. Livre, forte, confiante. A meio do caminho, a interrogação. “Levo vinho ou flores?”. Nas suas complexas dúvidas, faz o mesmo de sempre. Um cigarro. São 5 minutos que o ajudam no raciocínio. Decide-se pelo vinho. Segunda dúvida, onde o comprar? Lembra-se então da bem dita emigração ilegal, e corre para a loja dos Paquistaneses, ali mesmo ao lado. Lá chegado, nova dúvida (cheio de dúvidas o gajo...). “levo o vinho que eu gosto, o que acho que ela gosta, o que acho que ela deverá pensar que eu gosto, ou o que eu deveria pensar que ela gosta? F...., e agora?”. Problema resolvido, tinto só há dois. Vai o mais caro. Adiciona 2 maços de tabaco à compra. Espera-o uma longa noite de ansiedade. Nova correria, que já está atrasado. Chegado ao que julga ser o local, percebe que se esqueceu do número da porta. “E agora, tou f....!”. 100 metros para a frente, 100 metros para trás. Cócó pisado. “C....destes donos dos cães que não apanham a m....da m..... do cão!”. Está difícil. Mas está cheio de coragem.
Para a frente e para trás procura todos os números das portas, num exercício de absoluta estupidez. Afinal, se não se lembra do número, para quê olhar para os números. Estúpido.
Resolve ligar-lhe. Liga uma vez. Nada. Duas vezes. Nada. Três vezes. Nada.
“Mau...”.
À 4ª ela atende. “Estou, olha desculpa atrasei-me um pouco, tive um telefonema de última hora, um contrato importante, sabes...já agora o número da porta é o 92 não é?”. Não era, claro.
Mais um cigarro, e siga para a porta. Lá chegado, camisinha mais composta, cócó já eliminado da sola do sapato, breve passagem do sapato pelas calças para o polimento final, e toca a campaínha. Entra e sobe as escadas. Confirma-se, a sms era para ele. Uff...

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

escrevo

Palavras escritas sem destinatário. Recordam-nos o que de melhor somos. Fomos. Escritas para que possa ser ainda melhor. Escritas olhando para uma janela escancarada para a noite, onde a luz amarela reflecte no vidro a minha companhia nesta noite de um dia especial que acaba. Escritas para a boa recordação do sabor indescritível dum beijo, da força inesgotável de um abraço, da poesia terna e suave de um olhar. Escritas para que recorde sempre que existe o belo. Escritas para que a simplicidade pura, os movimentos únicos, o olhar inesquecível faça parte de um imaginário sentido. Escritas para alimentar o egoísta que aqui habita. Escritas ao sabor da memória das páginas escritas por José de Alencar, onde “cada palavra que se escreve é o espelho da palavra que falta”. Escritas assim, porque sim.

(...)

"Não há atitudes inacreditáveis. Tudo é acreditável e real, bastará ser-se um humano."

Goethe

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Azul


“...Francisco está assim, como em tantas outras noites. Impaciente, coração a rebentar, desejos frenéticos quase irresistíveis. Memórias, vontades, erros, culpas. Mas sobretudo noites, paixão, entrega, partilha e sabor. Os olhos dele cruzaram-se com os dela hoje. Benditas horas, pensa. Aqueles momentos em que viu pela nesga do vestido de Teresa o azul forte que nela ficava como mel em fel, assaltam-lhe o pensamento. Que vontade, que desejo de correr, beijar, abraçar. E vior embora. Sem uma palavra trocada, uma promessa velada ou um destino previsto. Só isso, vê-la e senti-la de novo. Nem que fosse a última vez...”

Long Live the Printed Blog

Desculpem, raramente vem para este canto esquerdo o trabalho. Hoje vem. Muita gente me pergunta, há muitos anos, o porquê de tanto entusiasmo demonstrado em cada projecto de trabalho. Que não entendem, que acham exagerado, que o entusiasmo ofusca, que desconcentra. Um conjunto de porquês que vão sempre por atacado para o recycle bin. Eu é que não entendo outra forma de fazer. Só sentindo com todos os poros do corpo, imaginando com todos os sonhos sonhados e concretizando com toda a paixão possível. É a única forma que conheço de ser e trabalhar. Com riscos demasiados, certamente. Mas com benefícios extraordinários. O primeiro, o de conseguir pertencer a um projecto com o arrojo, coragem, audàcia, qualidade e com sentido de pensamento como é o The Printed Blog Portugal. E o segundo, o mais importante de todos. Ter este gozo de fazer com quem faço. Esse, não mo retiram nunca. E é mais uma história que vou contar, a seu tempo. Long Live The Printed Blog!

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

a música, claro.

Espécie estranha, complexa, difícil.
Cheios de motivações e frustrações, construídos a partir de nadas e tudos. Formados em idades adultas com pensamentos e vontades. Mais que isto, formados com ansiedades. Procuram, pensam que encontram, falham. Procuram de novo, numa busca exaustiva pela tranquilidade emocional. De onde vem essa tranquilidade, muitos já escreveram, pensaram e até fizeram. Sendo eu um romântico, acredito (acredito sempre) que a maior tranquilidade possível virá do encontro do "outro". Encontrá-lo torna-nos gente melhor, gente mais forte, gente mais segura. Percebemos, aquando desse encontro, que existe aquele outro lado. Uns confundem com amor, outros com paixão, outros com cumplicidade, outros com identificação. Será tudo junto, provavelmente. E só quando tudo junto se encontra, se chega lá. Nos bons casos que conheço, e num caso que não é tão recente como seria de esperar, isto deve-se a identificação. Reconhecimento no mérito, admiração pelo trabalho, partilha de uma paixão comum, a música. Após esse encontro do "outro", fala agora com orgulho, com conhecimento fundamentado, com admiração certamente. Passa a ser um "outro" envolvido nas decisões, nas escolhas no trabalho, na cumplicidade de conhecimento. Tendo isto, terão tudo. E ainda bem. Neste caso, ainda bem. A música, a sua explicação, a sua construção, fazem parte da sua essência. Bom saber.