sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Vinho tinto



“Então vem”, dizia na sms. Elevado por uma mola forte, sai a correr e deixa um escritório desarrumado. Ainda mais. Pára, por segundos e conclui que aquela sms não era para ele. Não podia ser. “Que se lixe, se for para mim, bem bom. Se não for, vou na mesma, afinal de contas não se barra à porta quem traz convite. E o meu já cá canta.”, concluiu em menos de 5 segundos.
É já noite e a luz do prédio fraquinha esconde as escadas traiçoeiras. Alia-se a traição das ditas, à sofreguidão de Francisco e, claro, espalhanço. Camisa ajeitada, óculos recuperados e aí vai ele. Livre, forte, confiante. A meio do caminho, a interrogação. “Levo vinho ou flores?”. Nas suas complexas dúvidas, faz o mesmo de sempre. Um cigarro. São 5 minutos que o ajudam no raciocínio. Decide-se pelo vinho. Segunda dúvida, onde o comprar? Lembra-se então da bem dita emigração ilegal, e corre para a loja dos Paquistaneses, ali mesmo ao lado. Lá chegado, nova dúvida (cheio de dúvidas o gajo...). “levo o vinho que eu gosto, o que acho que ela gosta, o que acho que ela deverá pensar que eu gosto, ou o que eu deveria pensar que ela gosta? F...., e agora?”. Problema resolvido, tinto só há dois. Vai o mais caro. Adiciona 2 maços de tabaco à compra. Espera-o uma longa noite de ansiedade. Nova correria, que já está atrasado. Chegado ao que julga ser o local, percebe que se esqueceu do número da porta. “E agora, tou f....!”. 100 metros para a frente, 100 metros para trás. Cócó pisado. “C....destes donos dos cães que não apanham a m....da m..... do cão!”. Está difícil. Mas está cheio de coragem.
Para a frente e para trás procura todos os números das portas, num exercício de absoluta estupidez. Afinal, se não se lembra do número, para quê olhar para os números. Estúpido.
Resolve ligar-lhe. Liga uma vez. Nada. Duas vezes. Nada. Três vezes. Nada.
“Mau...”.
À 4ª ela atende. “Estou, olha desculpa atrasei-me um pouco, tive um telefonema de última hora, um contrato importante, sabes...já agora o número da porta é o 92 não é?”. Não era, claro.
Mais um cigarro, e siga para a porta. Lá chegado, camisinha mais composta, cócó já eliminado da sola do sapato, breve passagem do sapato pelas calças para o polimento final, e toca a campaínha. Entra e sobe as escadas. Confirma-se, a sms era para ele. Uff...