sábado, 9 de julho de 2011

Overtalking

Tarde dedicada à leitura de coisa antiga. Gosto da coisa antiga, parece-me sempre vir com outro sabor literário, outro cuidado linguístico, outra certeza nas ideias. Leio numa há muito extinta Grande Reportagem, uma entrevista a Martin Adler, um fotógrafo de guerra. Entrevista rara, era pouco dado a estar "daquele" lado, este fotógrafo chamado um dia de humanista. Adiante. Quando perguntado qual era de facto o grande problema dos grandes líderes africanos, que ele bem conhecia, respondeu que se resumia a uma palavra: Overtalking. Diziam sempre mais do que deviam, do que sabia, do que seria esperado ouvir. E comparava-os a alguns grandes líderes Norte-Americanos ou Europeus a quem, de facto, o "carisma" lhes vinha utilizando outros formatos comunicacionais.
Mas que, concluía, nada havia a fazer. É assim que eles são e serão sempre. Está-lhes no sangue e na alma africana.
Também o vejo hoje em muitos. Em mim, para começar. O Overtalking. Sempre o achei uma péssima receita para aquilo a que na nossa sociedade europeia se chama de "bem sucedido". A afirmação exagerada de palavras, opiniões, adjectivos leva qualquer uma a um estado ad nauseum. Poucos são os que gostam de ouvir, de retorquir, de argumentar, de afirmar. A maioria refugia-se na chamada reflexão. Na ausência de palavra ou som, significando isso mesmo a sua palavra. Quanto menos expõem, menos riscos correm. Quanto menos afirmam, mais podem contradizer. Quanto menos se dão, mais recebem. Utilizam os seus pequenos tempos de palavra para o julgamento simples, fácil e cobarde. Raramente ou nunca mesmo se prostam perante o espelho. E quando o fazem, é brilhante o seu reflexo. Puro, imaculado, doce. Angelical, mesmo. Fazem parte de um círculo muito curto de gente que, sabem eles, nasceu e vive sendo diferente dos "outros". Raramente lhes vemos um elogio, uma expressividade pura. Em público, certamente dificilmente lhes ouviremos um merda, jamais um foda-se. Vivem no julgamento do overtalker sendo eles, no seu mundo íntimo, escondido e ele sim ad nauseum, os mais ruidosos.