domingo, 8 de maio de 2011

Happy Family Frost


Um dia aquela carrinha da Family Frost parou, sossegou e pensou. Durante tantos anos, apesar de saber que tinha consigo as mais deliciosas doçuras, tinha sido constantemente denegrida, trocada, esquecida. Mal tratada e igonorada. O seu cliente preferido era assim que a tratava. Gostava muito de gelados, menos dos seus. Elogiava todos os doces que encontrasse, excepto os seus. E assim foi durante anos. Começava a sentir-se menos doce, menos possuidora de encanto, de delícia. Foi então que, após frustadas viagens por terras que não dominava, afastando todos os clientes que dele ase aproximassem, que a carrinha encontrou um novo cliente. E, com esse novo cliente, ganhou anos de vida. Pintura nova, novos sabores, circulava com a alegria que nunca lhe havia sido vista, passava por cada nova terra, novos clientes com orgulho. Sentia-se a carrinha Family Frost mais bonita do Mundo. E tudo por causa daquele cliente. Pensava hoje, que aquele era, de facto, o cliente mais improvável do Mundo, que chegou um dia, meio perdido, já esquecido daqueles sabores. Na verdade, ela sentia que eram sabores que nunca ele havia experimentado. No entanto, esta carrinha, depois dos anos e anos sem vender um único gelado, sabia que era, hoje, uma carrinha assim meio fragilizada. E então, cada elogio de novo cleinte, cada nova compra, cada novo sabor que lhe era elogiado, sabia-lhe a tudo. Sabia-lhe bem, muito bem. Afinal, sabia que os merecia há muitos anos atrás. E começou a sentir-se desconfortável com o cliente novo. Apesar de a ajudar a arrumar os gelados e a seleccionar quais os melhores para vender em cada dia, ela sentia-se abafada. Queria saber da sua existência, mas que a visitasse apenas de quando em vez. Habituara-se a um espaço só seu, e a poder responder e vender os novos sabores que entendesse, quando entendesse, e a quem entendesse. Afinal, se a elogiavam, porque náo saberia bem? E entao, hoje, estacionada junto ao rio onde descansada, lembra-se do seu cliente que lhe trouxe de novo o sorriso. E de nada se lembra. Absolutamente nada. E arranja-se, passa o lustro na sua nova pintura e parte. Distribuindo sabor. Feliz.