quarta-feira, 13 de abril de 2011

Mogadíscios


Martin Adler foi um cameramen Sueco que, já a meio da sua carreira se tornou repórter fotográfico de guerra. Passei anos e anos da minha adolescência a ver e ler as suas reportagens na Grande Reportagem, há muito desaparecida. Andou pelos 5 continentes e contou-nos dezenas e dezenas de histórias. Tinha uma característica especial, o seu olhar era parcial, como dizia. Em todos os conflitos, tinha um melhor olhar para quem mais sofria, independente da razão. E desenvolvia um trabalho de angariação de fundos internacionais em favor de pequenas carências que encontrava por onde andou. Era assim uma espécie de caixeiro-viajante no sentido literal da primeira palavra. Ficou célebre sobretudo pela voz que conseguiu dar aos rebeldes Somalis e à sua luta pela independência. Anos mais tarde, regressou à Somália (a guerra nunca havia terminado), para tentar recuperar as mesmas pessoas, mesmas histórias. Foi a pior decisão que tomou. Foi assassinado pelas mesmas catanas que um dia havia fotografado e mostrado ao Mundo.
É o destino de muitos. Um dia, sempre quando menos esperam, os seus Mogadíscios acontecem. Onde ajudaram a libertar, são hoje nada. Onde foram grandes, são hoje pequeninos. Onde foram a melhor gente, são hoje nomes inanimados, desprezados. É a absurda lei da vida, dizem. Resta-lhes apenas o óbvio. Fugir das catanas. O mais rápido, silencioso e indolor que conseguirem. Mas só depois de cumprirem o seu destino. Tal como Martin, que foi o autor da foto da sua própria morte.